sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Carol Girassol















O Amor nunca desiste
Dorme enquanto a flor nasce

O Amor jamais descansa
Inventa mundos enquanto dança

O Amor jamais enfraquece
Sonha enquanto agradece

O Amor nunca fraqueja
Acorda e veste-se de girassol!


Da preta pra nega branca

Pajarar



Tengo pasado el pasado para tras 
En las noches que contigo paso 
A cada paso siento el presente 
Pasando en la vena del vientre 
Que palpita como un pájaro revuelto

Mar Rubina

Resignação

                                                                                   
                                                                                    












Medos são coragens traumatizadas 
Bondades negadas 
São os gritos que querem ser risadas 
Dores antecipadas 
Arrependimentos que não nasceram
Medos são amores abortados
Livros fechados 
São corações trancados sem chave 
Ida sem nenhuma volta 
A porta que ninguém abriu
Medos são as fomes resistidas 
Saudades vencidas 
São beijos e abraços negados 
Discos riscados 
Vontades que morreram esquecidas

Ana Oliveira

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Paradoxo





















Nascem excêntricos
Hábeis em sua dualidade 
Relatam cartas e magias 
Mas não querem intuir 
Dois pesos, duas medidas 
Quando pensam no amor 
São impacientes na dor 
E corrosivos no humor 
Desafiam-se e festejam 
Ardilosos com os tolos 
Atenciosos com os sábios 
Seus camaleões coloridos 
Sabem do céu e da terra 
Das conversas consigo 
Viajam e voltam de mundos
Sem de dentro de si sair

Ana Oliveira

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Baldaquim





















Nasceu dentro da lua
No quarto do coração
Para as confissões
Recorre com freqüência
Ao diário íntimo
Alma delicada e taciturna
Não digere facilmente
Alimentos emocionais
A inconstância ali ausente
Seu lugar são os tons
Da madrugada tenra
Esconde-se em casulos
Carapaças protegidas
Ainda que por dentro
Sentida carne macia.

Ana Oliveira

Décimo primeiro





















Nasceu em Saturno
Mas ali não queria viver
Tantos mundos na cabeça
Sem habitar nenhum
Iniciou sua incursão
Ao planeta que não era seu
Tampouco de ninguém
Alimentou seus signos
Renegou seus preconceitos
E com quase nenhum plano
Rumou à curvatura da terra
Precisava compreender
Porque seu pedaço de céu
Parecia sempre tão pequeno.

Ana Oliveira

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Prenunciação





Vazio morava com Solidão. Sempre aflito, isolado. Fazia de tudo para encher-se. Viajava, comprava, consumia doces que se transformavam em devaneios amargos, amava tolas, vagas e ocas. Tudo inutilmente. Nutria uma paixão secreta por Solidão, platônica. Esgueirava-se pela casa espionando nos olhos vazados dos quadros, fechaduras e buracos na parede, inventava subterfúgios para chamar a atenção da amada. Nutria por ela um desejo doentio, quase mórbido, quase sádico, quase amor. Um dia decidiu declarar sua ânsia. Há muito viviam sob o mesmo teto, porém, não compartilhavam das mesmas angústias, tampouco das mesmas aflições. Solidão era forte, segura, resolvida. Vazio era indeciso, amargurado, distraído. Solidão ouviu a confissão quieta, sem proferir opinião alguma, esboçou apenas um sorriso amarelo e pediu para que Vazio fosse embora. Ele ficou ali, dentro do seu vão, sem órbita, não sabia e nem conseguia pensar em mais nada a não ser em imergir em si mesmo. E assim o fez, penetrou no precipício do vácuo e se foi. Solidão cravou uma placa no jardim: Há vagas. E muito em breve ouviram-se sonoras palmas. Era a liberdade pedindo se podia ali viver. Solidão mais que depressa abriu as portas e janelas de seu lar e de seu coração. Liberdade fez-lhe apenas um pedido: que Solidão deixasse que seu irmão de quando em quando a visitasse. A anfitriã ponderou, mas antes quis saber o nome do visitante. E tão breve como o voejar da borboleta, rendeu-se.

Afinal, não se pode negar nada ao Prazer. 


Ana Oliveira

Recôndito



Segredos são vontades guardadas no fundo da gaveta do desejo. Sentimentos tímidos que preferem o anonimato, o estranhamento. O segredo do desejo é a espera. A secreta tardança que gira o mundo aos poucos, acariciando suas entranhas e embalando seus caprichos na inútil tentativa de dissuadi-lo do objeto escondido, desejado. Mas a fome do querer é impetuosa. Por isso, o segredo da espera é a distração. O delicioso devaneio da irreflexão, do alheamento voluntário que nos permite ludibriar até mesmo a tentação das confissões. E é no cochilo que o segredo devém mistério. Mistério é a magia do segredo. Andam em todos os cantos, debaixo das pedras, das camas, impressos nos olhos que riem do que ninguém supõe. Ocultos nas folhas brancas que denunciam os escritos arrancados. Manchas que querem ser adivinhadas através de suas cores e cheiros. São flores deixadas em caixas postais sem alcunha nem palpite. Pernas que conversam sob a mesa, bilhetes deixados em bolsos, abraços que procuram motivos para serem demorados. Mistérios são enigmas que querem ser desvendados, são as peripécias do segredo.

Ana Oliveira

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Tão





















Já não tenho tanta calma
Com estas almas que sugam
Pessoas que de tão pesadas
Me deixam assim tão cansada

Já não quero tanta gente
Com promessas tão vazias
Egos que de tão gigantes
Tornam a vida angustiante

Já não aguento essa tortura
De ser tão acaso do nada
Quero a escolha e a paz da ternura

Já não suporto ser tão torta
Tão bengala da vaidade alheia
Que o vento leve para longe esta porta.

Ana Oliveira

Usted para mí





















Usted y esa alma clara
Que no hay medida
Para emocionarme

Usted y esa sonrisa suelta
Que no mide esfuerzos
Para conquistarme

Yo quiero tenerte acerca
Ya no me despierto
Sin desearte

La vida con usted impera
Y la añoranza espera
Para hechizarte

Usted y ese canto libre
Que no hay límites
Para relajarme

Usted y estos ojos fondos
Qué vienen en un segundo
Para observarme

Yo quiero con usted un fragmento
Solo para tener tiempo
Para aproximarme

Los días están contando las horas
Nuestro abrazo aflora
Para el amor amarte

Carmen Rojo


Ciganear

Certa vida quando lida
Se revela nau sofrida
Nem disfarce, alegoria
Devolve à alma a alegria

Uma mão quando estendida
Tem a hora interrompida
Para o tempo num suspiro
Sofre de futuro o respiro

Vivos olhos que esperam
Ânsias, medos se revelam
Ao que o fado lhe decifra
Menos tempo lhe acredita

Fé que foge quando olhada
Não espera quase nada
Nasce para outro tempo
Vai embora como o vento

Ana Oliveira

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

De perto














De perto nada é certo
Pois o porto
De perto é outro
Porém de perto
É certa a pele
O tronco
O ponto
O gelo
O fogo
De perto é beijo
É a natureza das coisas
Das costas
Das pernas
De perto tem o som da voz
O mundo é descoberto
E a alma desperta
De perto tem o sonho ao lado
Tem a vela acesa
A mesa posta
A noiva morta
A carne
A Carmem
De perto nada se espera
Tudo se cheira
Se come
Se fala
Se cala
De perto tem o ouvido
Que treina pra receber
O canto no canto
Da boca
Da roupa
Do quarto
De perto tem o moço
Que acalma e aguça
Que canta e encanta
A moça que sonha
Que espera
Que aperta
Tem o sorriso
Que ameaça um beijo
De perto é a vontade
Da saudade

M&A

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Três dias



Três dias com você não seriam bons. Seriam três dias em que me acostumaria com teu corpo quente, tão incomum em minhas madrugadas inóspitas. Talvez fossem três dias onde eu esqueceria de apagar as velas ou a chama do fogão. Três dias. Três longos dias que seriam como três ligeiras horas. Certamente setenta e duas horas de batimentos cardíacos acelerados, não da saudade cotidiana, mas da espera que acontece, do desejo que não tarda. Seria pelo menos três cafés acompanhados de olhos que não querem fechar para não perder o outro de vista. Três pães temperados com o gosto doce da noite que ainda não dormiu. 

Três dias com você resultariam em três noites. Três noites em que esqueceria a fome que se come e cessa. Três madrugadas em que a sede seria apenas de mais um beijo molhado de vinho e que este, seria apenas aquele que precederia o próximo. Três dias com você significaria os únicos três dias sem saudade desde que te conheci. Minto. Seriam apenas três fins de tarde em que não andaria calmamente, correria... 

É... Três dias com você não seriam bons. Bom é uma palavra calma, delicada, útil. Mas três dias inteiros com você não seriam calmos, delicados, tampouco úteis. Essas quase cem horas em que minha alma não desconectaria da tua seriam rasgadas, suadas, abusadas e inúteis. Inúteis para o resto do mundo que lá fora continuaria a correr. Três dias com você seriam sem hora, nem ponteiro. Sem amanhecer, nem anoitecer. Três dias ao seu lado seriam três marcas no espaço onde o tempo seria medido apenas pelo intervalo do nosso amor.


Ana Oliveira

O não do amor


Amor não tem que preocupar, tem que ocupar. Ocupar o armário com as roupas que se abraçam no silêncio da noite. Ocupar o quarto com os cheiros que se confundem numa dança frenética, ora odor, ora perfume. A mesa com os vinhos das terças que são melhores que sábados. É encher a geladeira com o prato predileto que ocupa os intervalos entre filmes e beijos. É entrelaçar fortemente as pernas para ocupar todos os espaços entre as peles. Amor é ocupar o tempo para que ele se atrapalhe e esqueça de passar. É um ocupar-se de si mesmo para estar bem para e com o outro.  Amor é deixar a vida com vontade de se ocupar da outra que também é sua, que também é dela.

Amor não tem que prever, tem que ver. Ver que aquele rosto sorrindo esconde um cinza que quer ser aquarela, que deseja ser pincelado mais de saliva, menos de lágrima. Perceber que aquele “não” é apenas a potência de um sim que quer ser adivinhado, timidamente descoberto. Amor é também não ver. É não precisar ver aquilo que só pede para ser intuído, que só sonha em ser ouvido. É enxergar que aquela bagunça da casa, talvez seja a confusão de uma alma que está em reforma ou precisando de abraço. É não esperar que o outro apareça, procure, convide, mas o sossego da hora que só tarda, não demora. Amor não é antever o fracasso. É lamber a ferida com as palavras do alento que enfim repousa no colo da cumplicidade.   

Amor não tem que preparar, tem que parar. Parar de apontar no outro aquilo que o próprio espelho denuncia. Estancar o sangue da veia que desconfia do que mora apenas na mente de quem aprisiona o afeto.  Ele necessita parar de querer amar sozinho. Entender que solidão boa é a da escolha, não aquela em que dois corações batem em descompasso, em cada canto, em cada quarto. O amor tem que saber parar o choro sem sufocar as lágrimas que também lavam a dor. Não pode impedir a liberdade de voejar o seu livre arbítrio e de poder voltar para a gaiola do colo sempre vasto e a espera.  O amor precisa interromper a saudade quando a vontade já não responde aos estímulos da calma, sofre de urgência. 

Ana Oliveira

Cura

Não pensar é uma arte.  A arte de esquecer só um naco, um lapso, um pouco. Não pensar é um subterfúgio que devolve o sorriso, ainda que breve. E  nesse intervalo entre o pensar e o “não” é que a vida acontece. Não pensar é o amanhecer que vai acordando com a fronha mais seca das lágrimas da saudade. São os olhos que deixam de enxergar em preto e branco e a cada piscada pintam uma tela de possibilidades. Esquecer não é não pensar. Esquecer implica em enterrar o pensamento e torcer para que a memória involuntária não nos presenteie com o tempo perdido num domingo de manhã. Não pensar é a esperança do esquecer. É um espaço onde a angústia dá trégua para o desejo descansar. Um lugar onde o sabor e os aromas da lembrança permitem que se prove de outro tempero, ainda que azedo, ainda que cure. 

Ana Oliveira