sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Tristeza, a inoperatividade da alma


Hoje é um dia em que eu estou especialmente triste pela humanidade, humanidade que não olha para os lados, só olha o próprio umbigo, humanidade hipócrita que olha uma criança africana e diz: que dó, façam alguma coisa por ela! Mas passa por cima de um gato ou cachorro de rua. Humanidade que diz: salvem as baleias! Mas come animais torturados em fazendas e frigoríficos. Gente que maltrata animais, mas que compra Pets por uma fortuna, gente que acha gay normal, mas meu filho não! Gente que não é racista, mas atravessa a rua quando vai encontrar um negro.

Ando chorando todos os dias, tudo isso me afeta demais, as minhas questões andam tão pequenas sabe...tudo que reclamo parece bobagem perto de um cachorro doente e com fome, uma criança maltratada e a ganância sem limite e sem janela para o mundo. Eu queria fortemente poder ignorar tudo isso e ser feliz no meu mundinho perfeito, mas uma vez visto, nunca mais se pode parar. Tenho me fechado ainda mais, é verdade, mas penso que é um processo mesmo, de conseguir assimilar tudo isso para depois reagir, nesse momento me sinto imprestável, impotente diante das injustiças, queria poder fazer algo maior, algo realmente significativo, mas agora tenho ainda minhas pequenas e insignificantes questões.

Acho que a humanidade não vai longe não. Adianta nada estar conectada com o cosmos, blá, blá, blá e não olhar ao redor ou pior, olhar ao redor e achar que tudo faz parte do equilíbrio do universo. Sinceramente esse papo de equilíbrio do cosmos é coisa fantasiosa pra mim, pois saio da porta de casa e vejo o vizinho fumando no corredor, atravesso a rua e vejo um idoso procurando lixo pra sobreviver, dobro o quarteirão e vejo um caminhão cheio de animais chorando e gritando por liberdade, chego à faculdade e vejo gente que não entra no mesmo elevador de um haitiano...

Olha, se isso é ver o mundo de maneira pequena e limitada, não sei mais qual é a dimensão das coisas. E os meus olhos não são melhores porque enxergam, nem piores porque questionam, são apenas duas janelas abertas cuja tristeza tem tornado inoperantes. 

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

No meio do caminho de Drummond


No caminho de Drummond provavelmente houve muitas pedras. A pedra primeira guerra mundial já presa em suas sandálias infantis, aos doze anos. A pedra solidão, dita e redita em seus poemas, a pedra Deus e a dura sina de ora crer, ora duvidar. A pedra “um mineiro no Rio de Janeiro” e tantas outras pedras de tantos outros conflitos bélicos, quentes ou frios, vividos pelo poeta no Séc. XX.

Embora o poema No meio do caminho tenha sido renegado pela crítica ao dizerem que “aquilo não era poesia e sim uma provocação”, ou ainda que eram “versos pobres e repetitivos” a pedra para Drummond não fora apenas essa ou aquela conjectura leviana. Esta é a pedra drummondiana do obstáculo, seja dos seus próprios conflitos com o mundo e a sociedade em que viveu, seja no próprio – e talvez intencional – poema obstáculo, criado exatamente para esse fim.

O poema fora escrito em 1928, e Drummond, ao escrevê-lo, parece ter adivinhado o futuro nebuloso do planeta, como um profeta da pedra, um “bruxo do obstáculo” já que pouco depois estouraria a segunda grande guerra e em seguida, os duros anos de ditadura no Brasil. Já escrito, o poema parece anunciar um tempo de dor, tempo das retinas fatigadas pela brutalidade das torturas impostas e as feridas expostas de seus companheiros políticos, seus amigos, cujo o único pecado fora acreditar mais na flor do que no asfalto.

Assim como o poeta, também temos nossas pedras. Nossos impedimentos não são diferentes dos de Carlos. Somos Carlos, Marias, Reginas e Pedros incompreendidos, renegados, subestimados. E assim como ele, o Carlos poeta, na maioria das vezes, jamais esqueceremos.

Chapecó, 28/09/2017.