quinta-feira, 3 de março de 2016

A chuva dos olhos

Hoje, ao acordar, chovia. Não aquelas gotas cinza-gelo dos dias que lá fora, proclamam a chegada do outono, mas aqui dentro. Ao abrir os olhos, vi uma nuvem grudada no teto da minha casa e outra alojada no meio do meu peito. Então esperei que chovessem braços, que deles viessem mãos e delas surgissem afagos capazes de arrancar esse cansaço que a alma chama de saudade. Desejei que o chão revirado pela enxurrada se abrisse e raízes macias com cheiro de terra molhada subissem em minhas pernas, emaranhadas como um abraço deve ser, firme e recíproco. Mesmo com medo, ansiei que um vendaval com nome de moço chegasse, anunciado por uma brisa quente e que logo depois, fizesse meu coração levantar voo junto aos móveis e sonhos, num insano e mágico arrebatamento. Ao acordar, implorei ao vento para que abrisse meus olhos grudados pela chuva e pela dor de um sentir sujeito a morrer seco, sem palavras, desesperado e só. Porque até para maldizer o amor, tem que amar. 

Ana Oliveira

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