Para esquecer alguém de quem se gosta muito,
e não se quer esquecer, não basta querer.
Há de se fazer um esforço semelhante ao levantamento
de dois ou dez elefantes, simultaneamente.
Se for uma formiga, substitua o elefante por besouros ou vaga-lumes obesos.
Para deslembrar deve-se sentar em um lugar usado para pensar.
É imprescindível a companhia de uma xícara de café e,
para os fumantes, de um cigarro.
Comece então a refletir e responda se a pessoa a ser esquecida
aplicaria a mesma força, que envolve elefantes,
besouros e vaga-lumes obesos, para também te desquerer.
Se a resposta for sim, desista imediatamente de esquecer.
No entanto, se o pensamento titubear,
enroscado nos emaranhados cabelos da dúvida,
passe para a próxima etapa: a execução.
Uma das técnicas que poderá funcionar é a da distração.
Distraia-se a espera do eclipse que só voltará em meio século
ou limpando folha por folha das mais de trinta plantas do jardim,
porém, lembre-se de passar longe das rosas vermelhas.
Aconselha-se a ler algum poema,
que pode ser qualquer um que não fale de amor.
Saudade também é perigoso.
Em hipótese alguma se distraia abrindo velhas caixas,
relendo bilhetes, dedicatórias,
nem ouça aquele disco sobre terças-feiras ou cavalos.
É recomendável que se ande normalmente pela rua, ora olhando para cima,
ora para o chão e, em algumas vezes, para um letreiro ou vitrine.
Isso evitará que se encontre um rosto, um cheiro ou uma voz.
É também salutar que não se repita situações as quais
possam comprometer o trabalho até agora empreendido,
como as madeleines oferecidas em cafés na cama,
discos de bolero ou a releitura daquele livro
que jamais deverá ser devolvido sob pena de,
fatalmente, estragar o esquecimento.
E lembre-se, para esquecer procure ter comprovadas evidências científicas
de que também já fora esquecido.
ps.: Experimento em fase de testes. Na dúvida, desconsidere-o.
Ana Oliveira