terça-feira, 29 de setembro de 2015

Des-esperar





















Quando tudo que já se teve
Faz o hoje um devir fria neve
A dor que antes na alma rara
Agora negocia a alegria cara

O querer que teimava ano a ano
Ao passar tornou-se frio engano
E a vida que outrora feliz seguia
Zomba do rosto, cansada agonia

Como voltar por um caminho morto?
Já não há atalho mesmo que torto
O mundo prossegue pedra sorrindo
E a gente continua carne fingindo.

Ana Oliveira

Encanto















O corpo que ora profano, ora sagrado
Quer e se não, renega o desejo alheio
Flutua quando cabe em si, por si só
Beija a mão de deuses desgarrados
Lambe a ferida de monstros sagrados

O corpo que anda no pó da contramão
Queimado na fogueira das palavras
Banido pelos olhares e falácias afãs
Faz do caos aquilo que lhe convém
Enfeitiça o mal e seduz seu bem

O corpo que nem perfeito, nem pouco
Dança nu em telhados e fases de lua
Renega o vil poder da tortura santa
Abusa da magia limpa e invisível
Ama-se sobre o altar do impossível

Anna Poulain

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Tuas cores
























da janela espero o dia amanhecer
o sol já vai chegar
amarelo como o dia deve
ter você vai despertar...

arco-íris, sete cores em teu ser
pra um dia eu descobrir
qual a cor e o segredo pra fazer
os teus olhos sorrir

tons em verde,
vejo flores em você queria te dizer
teu perfume, um jardim dentro de ti
vem me entorpecer

céu azul, vejo raios furta cor
o sol já vai se pôr
acontece quase sempre sem querer
o vermelho do amor.

Anna Poulain

Vuelo















Cuando el corazón sube
Separa los pies del suelo
Encuentra un lugar mejor
Para vivir en otro sentir

Cuando se olvida el controle
A nadie pide perdón
Concede a pasado pasar
Repara que el mundo para

Cuando abre la mano egoísta
Ni mismo se pierde de vista
Percibe que así sin dolor
Vivienda le hace el amor

Mar Rubina

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Languidez



Através do reflexo do vidro da janela vi você passar, em uma tarde qualquer. Coração feito um trem desgovernado, o suor escorrendo pelos vincos da pele, pupilas ansiosas e ao mesmo tempo disfarçadas, mãos geladas em pleno verão tropical. Depois de muitos dias na árdua tarefa de esquecer o desenho do teu rosto, eis que tudo está arruinado. E nesses poucos minutos em que caminha de uma esquina a outra, pela roupa que usa, o jeito que anda e a direção para onde olha, leio tua alma e as emoções que naquele instante, em ti afloram. Porque toda vez que quase te esqueço algo quase me traz tua vida de volta? Nem mesmo para as perguntas gostaria de quimeras. Preciso que abra mão desse caminho, que esqueça meus cheiros e músicas e atravesse para o lado certo da rua que escolheu andar. É inútil matar um amor que já nasceu em estado terminal, sem espaço, nem tempo. Não almeje procurar quem já não suporta mais arder.

Ana Oliveira

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

A última cinza

















Você salivou tanto
Que teus ouvidos entupiram de egoísmo
A tua insistência foi tamanha
Que não houve resistência
Contra a força do laço, nem do abraço

Tanto fez que feriu a espera úmida
Da lágrima que virou gosto e cor de sangue
Agora pousa uma pedra de asas negras
Em cima do coração que agoniza

Sobre minha sina torta e morta
Revoa a tua vida mais que perfeita
Assim, o esquecer suplica à lembrança
Deixar quem nunca lhe dedicou

Tento matar a golpes precisos
O tempo que foi perdido
Acabou o sol
Acabou o cigarro
Acabou no crematório

No final, tudo acaba em cinza.

Ana Oliveira

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Contemplação



















Mergulha
Na beleza de uma vida
Que não quer ser rasa
No mistério dos elementos

Transborda
De riqueza interior
Que renega o material
Ínfimo diante da alma

Transcende
Além do ouro e do linho
Em amor corpo sem ninho
O superficial nada mais é

Converge
Em energia que conecta
No mundano que unge
O virtuoso que transgride

Anna Poulain